sábado, 7 de novembro de 2009

O velho Bazar



Deslumbrado pelas imagens e histórias, que nos trazem à memória aquelas recordações de outrora, a  viagem no tempo leva-me até ao antigo Mercado Municipal Vasco da Gama, hoje Mercado Central de Maputo. Trata-se de um edifício de traça colonial ,construído em 1901 em plena baixa da capital moçambicana, onde o cimento, estruturas metálicas bem trabalhadas e madeira se fundem em perfeita sintonia. Quantas vezes entrei por um dos quatro portões, muitas vezes acompanhado pelos meus pais para necessárias compras. Recordo a azáfama  no seu interior, povoado de vendedores e vendedeiras que representavam todos os continentes, numa simbiose de raças e culturas. Em pleno Verão, era vê-lo apinhado de turistas sul africanos e também muitos rodesianos, transmitindo mais vida aquele espaço. Era usual caminharem pelos corredores, descalços, trajando simples calções de caqui ou desportivos, camisolas interiores coloridas e chapéus de palha. Ao tiracolo traziam sempre a inseparável  Kodak para recolherem fotografias para os seus álbuns de férias. Pelo meio sucediam-se as inevitáveis pisadelas que nos obrigavam eticamente a pronunciar o tradicional sorry. Ouviam-se os pregões  das mamanas (mulheres negras adultas) que anunciavam a venda de frutas tropicais, marisco e víveres do mar. Como era agradável  sentir no ar o aroma daquelas suculentas  e apetecíveis  mangas, tingidas de amarelo e vermelho lacrimejando uma espécie de resina, papaias sarapintadas, ananases e abacaxis enfeitados com as suas coroas de folhas, as afamadas tangerinas de Inhambane , citrinos e cocos apaladados. Regateava-se o preço de todos os produtos. Num dos recantos do mercado, as panificadoras, tinham os seus pequenos depósitos de vendas onde se podia comprar bom pão e os famosos scones  e outras doçarias. Também  não faltavam as bancas dos produtos hortícolas e os poemas dedicados aos agriões dos viveiros do produtor Louro. A ala dos indianos vendia as maçãs, peras, uvas e pêssegos, fruta importada da cidade do Cabo. Das prateleiras das suas lojas, eram vendidas ao cartucho as especiarias que nos invadiam as narinas, muito especialmente o pó de caril que fazia as delícias de uma gastronomia recomendada. Pertenciam a esse clã as lojas de vendas de roupas tropicais, capulanas garridas, todo o tipo de bugigangas, brindes, missangas e artesanato. Junto a um dos portões ficavam os postos de venda de aves. Não esqueço que junto ao portão da fachada, se achava o popular café do “Xico” do bazar que tinha a singular particularidade de por vezes servir cafés, sem colher .Nas mesas do fundo em tabuleiros já gastos pelo tempo, jogavam-se partidas de damas, muito acaloradas. E se me permitem, por hoje cabe-me encerrar o bazar, dispensando as badaladas do paciente sino de latão. Acho-o por momentos vazio, aquele centenário bazar sempre jovial aos olhos de quem bem lhe quer, que tudo vendia à exceção da simpatia, que era oferecida pelos seus arrendatários...

Manuel Terra

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